sábado, 11 de julho de 2009

Ser Especial

Desde já algum tempo que percebi que nada na vida realmente nos pertence e nada tenho como seguro.
Nada! Nem o emprego, nem a vida pessoal, nem sequer a família e os filhos, no meu caso o filho. Talvez por isso, cada vez dê menos valor aos objectos e faça até (embora por vezes com dificuldade) por não me prender demasiado a estes.
No entanto, existem pequenas coisas que sendo peça de puzzle do nosso passado se tornam quase parte integrante da nossa existência.
Como exemplo, a Nossa Senhora da minha tia-avó que sempre que me via aproximar dela vinha a correr fazendo-me mil recomendações e temendo que a partisse.
Confesso que era uma criança um pouco teimosa nesse aspecto pois, lembro-me que adorava o barulho das peças a estilhaçar no chão. No entanto, aquela Nossa Senhora era uma excepção neste meu ímpeto. Eu realmente aproximava-me dela por exercer sobre mim um fascínio especial.
Se era merecedora de tanto cuidado pela minha tia é porque tinha algo de respeitável e misterioso. Como tal, despertava de mim uma vontade imensa de lhe tocar. Fazia-o sempre com carinho parecendo ser os receios da minha tia infundados. Na verdade, um certo dia, sem querer acabei mesmo por danificá-la um pouco tendo sido reposta com cola. Hoje está no meu quarto e reservo-lhe o mesmo carinho de então.
Também gostaria de ter comigo os meus trabalhos da escola primária.
Agora que escrevo, adoraria observar com outros olhos as minhas redacções e desenhos. Na altura tínhamos uma senhora que lá trabalhava e quando fez limpeza a um espaço a que chamávamos de adega por o ter sido em tempos, fez de facto uma "limpeza" completa. Durante uns dias evitei cruzar-me com ela, tal era a tristeza quando descobri!
Quando pensava às vezes no meio dos meus receios na hipótese de um incêndio, sei que a primeira coisas que pegaria seria nas fotos e filmes do meu filho. São as minhas recordações de momentos que não voltam mais. Traria também comigo o livrinho que escrevi sobre ele desde que soube que estava grávida até à 1ª infância.
Mas porque me deu para estas considerações?
Simples, senti saudades dos meus passarinhos. No ano passado em Março, quando regava as plantas da minha varanda deparo-me com um cenário que me fez ficar estática sem saber como reagir. Entre as minhas flores um ninho com um passarinho -fêmea que me olhava desconfiada. Fiquei sem respiração e após uns segundos, decidi sair com a maior suavidade e discrição possível. Ora esta! O que fazer agora? Não posso perturbar o ninho, mas não quero que morram as minhas florinhas. Levei esta questão aos meus meninos acompanhada de fotos que as deliciaram. O que fazer?
Aconselhou-me o meu pai depois que as regasse quando não estivesse a mãe e evitasse regar perto para que a mãe não rejeitasse os ovos, a água espalhar-se-ia depois pela terra. Assim foi.
Durante várias semanas ia fazendo o registo fotográfico e partilhando com os meus alunos que andavam maravilhados com o acontecimento, aliado a narrativas sobre a minha luta para não permitir que o meu gato fosse dar asas ao seu instinto predador.
Assisti ao abrir dos ovinhos, à saída dos passarinhos…Foi lindo ver o companheirismo do pai que ia buscar a comida e sempre vinha pela parte de fora das flores espreitando entre as folhas para a sala a ver se não tinha assistência. Só depois de alguns segundos, confiante do caminho livre, se dirigia à mãe a quem dava alguma comida para dar a uns filhos enquanto ele dava a outros.
Um dia a despedida! Tive muita sorte. Da minha sala de máquina na mão, consegui ver do primeiro ao último a sair. Foi lindo ver o último que se recusava a ir, sempre que tentava esboçar um gesto de liberdade acabava por escorregar um pouco agarrando-se aos cales e subindo novamente para ao pé da floreira. Curiosamente um dos irmãos volta a trás, chilreia palavras de encorajamento, ele faz tentativas até que finalmente sai decidido indo depois parar na varanda do prédio em frente. Digo-lhes adeus e lágrimas rolam pelo meu rosto. Mantive com todo o cuidado o ninho esperando novamente esta dádiva, mas desta vez resta-me a recordação. Talvez por isso hoje me tivesse detido a pensar nos meus passarinhos. E porquê aquela introdução toda? É que de repente apeteceu-me postar aqui as fotos destes pássaros e não as encontrava. Há tanta foto destes animais na Net, tanta… ah, mas essas não têm a imagem dos "meus" passarinhos que decidiram aqui fazer nascer os filhos nem o ninho seria aquele que vejo vazio todos os dias e que persisto em manter na minha floreira.

Depois de muito tempo a procurar descobri-as numa pen que já não uso. Aqui partilho convosco.
Por opção e pouca vontade de rever, não voltei atrás a reler o texto, perdoem alguma repetição de palavras ou menos cuidado no texto…


Depois de nascerem ainda cheios de penas finíssimas e raras




O pai por trás observa olhando para a direita, esquerda e em frente onde imóvel tiro a foto, enquanto os filhotes aguardam que o pai lhes entregue a comida que anseiam.


Comendo com ajuda do pai e da mãe




Depois da paparoca, uma boa soneca e assim vamos crescendo...


Até que certo dia, um de cada vez, fomos voando






Ora e eu, fico sozinho? Tenho medo, voar parece-me tão complicado. Ei, alguém me ajuda?



Meu irmão veio-me buscar. Juntinho a ele, tenho coragem para voar. Adeus!

16 comentários:

Áurea disse...

Que grande MULHER e agora amiga, eu tive a sorte de conhecer.
Adorei o teu texto ou história e podes crer que o li duas vezes. Só mesmo tu para teres tanto carinho por coisas que para outras pessoas são tão "banais".
Eu também sou um pouco assim. Compreendo-te.
Um grande bjo.

Leonor Lourenço disse...

Claro que sim, as pessoas semelhantes têm têndência para se aproximarem. Essa história dos opostos se atraírem á mais nas questões amorosas... na amizade aproxima-se quem fala a mesma lingugem.
Quanto a leres duas vezes o texto é que é mau, deve estar cheio de gralhas, mas às vezes escrevo e custa-me rever...é mais para deitar para fora as emoções...Beijo. Fico feliz por teres apreciado o texto.

Leonor Lourenço disse...

para além do mais os contadores de histórias geralmente aguçam o espírito de observação e o sentimento pelos pequenos seres

Presépio no Canal disse...

Que história deliciosa e que privilégio acompanhar os passarinhos :) Ainda bem que se encontrou as fotos :)
Beijinhos.

Áurea disse...

Sem dúvida...Faço minhas as tuas palavras"aproxima-se quem fala a mesma linguagem".Quanto ao texto o importante foi o conteúdo.bjo

Leonor Lourenço disse...

Obrigada a ambas. beijinho
:)

Ana Paula Pinto Lourenço disse...

Esqueceste-te de contar um pormenor, que faz de ti uma pessoa ainda mais especial: nesse dia telefonaste-me de manhã e disseste-me: não me preguntes porquê, mas tenho a sensação que é hoje o dia que os meus pássaros esoclheram para o seu primeiro voo. E foi!

Sabes outra coisa ue me entusiama em ti? ´que aguças o esírito crítico dos teus alunos e os obrigas a olahr para as coias e a participar nelas. Que outra educadora se lembraria de levar diariamente as fotografias e de dar às crianças a imprtância de lhes pedir conselhos sobre o modo como agir?

Lembras-te da conversa de ontem à tarde? tens aqui a resposta!

Leonor Lourenço disse...

Sabes Paula, seria difícil para as pessoas compreenderem algumas coincidências... preferi não referir isso, mas lembrei-me. Obrigada pelas tuas palavras.
Beijinho :)

Leonor Lourenço disse...

Coloquei o computador virado para a janela e fiquei a trabalhar aguardando o momento. Há coisas curiosas na vida. Aquele dia era especial, tu sabes... :)

neli araujo disse...

Olá, Leonor!

Obrigada pela visitinha no meu blog de hai-kais!

Acabei de ler sobre teus passarinhos, e quando vi as fotos emocionei-me. Deve ter sido lindo acompanhar ao vivo cada momento destes aí retratados!

Tua forma franca e sincera de escrever é muito
agradável para quem te lê! Gostei muito!

beijinho,

Neli

Isabel Preto disse...

Olá Leonor:
simplesmente maravilhosas, as fotos e o texto.
É destas coisas simples, mas tão lindas, que se alimenta a nossa alma!
Obrigada.

Zilto disse...

E o teu ninho passou a ser a santa que tantos desvelos a tua Tia tinha.

As mesmas memórias que tens agora desse tempo já as passaste aos teus meninos. Um dia hão-de dizer que tiveram uma "Senhora que lhes contou uma história mágica sobre passarinhos". Não a esquecem, hão-de passá-la a seus filhos como um tesouro.

Essa é a magia das coisas simples.


BeSoS


PS. De facto, foste afortunada. Quantos terão assistido a este acto de beleza com que nos presenteias nas fotos?


que fantástico regresso o meu aqui.

Leonor Lourenço disse...

E que conclusão interessante retiraste desta "história" real, Zilto.
O ninho continua lá... quem sabe para o ano nasça um netinho de um dos passarinhos:)
Volta sempre.

BeSitos
Leonor

Vitor Lopes disse...

Leonor
Tenho acompanhado ao pormenor o teu espaço.... e que espaço...
Fico contente com o percurso, ainda bem que te aventuraste.
Este post, para mim tem uma carga nostálgica muito forte.
Faz bem lembrar das coisas.
Eu ainda tenho guardado algumas coisas da minha escola primária, e porque gosto assim tanto, tenho tudo o que os meus filhos fizeram, desde a pré, mas tudo mesmo, rsrsrsr
Beijos

Leonor Lourenço disse...

obrigada Victor por seres leitor atento deste blog.
É muito mais gratificante quando os outros apreciam o nosso "trbalho".

Toca a nos mostrares também novas fotos. Nós gostamos!
Bj
Leonor

Leonor Lourenço disse...

Olá

Sabes há alturas em que conseguimos traduzir as emoções por palavras. Julgo que este terá sido um desses momentos.
Existem pessoas sensíveis que têm dificuldade em transmitir as emoções.... conheço pessoas assim... ou que as manifestam através da música, da lágrima no canto do olho, através do arrepio, na tela, ou até de um simples "olhar" .
Outras sentirão mas não sabem ou não querem transmitir...
Todos aqueles que sentiram algo neste texto são, pessoas que de algum modo se identificam, se assemelham, não será, pergunto.
Acima de tudo o mérito é mesmo dos passarinhos que me seduziram, da minha floreira que os convidou e da minha janela rasgada que me permitiu "este meu olhar"
Beijinho amiga :)